quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

A PROPÓSITO


Graal
Eduardo Tornaghi

Há uma outra leitura
dentro de cada poema
não se contente nunca
com um sentido apenas.

Há na superfície mesmo
escondida nas obviedades,
nas tônicas, nos termos,
nas virgulas, na sintaxe

uma pulsação que exala
o mistério das sensações,
uma alguma outra fala
que salta de formas e sons.

Sentidos muitos se tramam
em teias, em redes, impulso
onde o que nos humana
goza ao tocar o oculto.


Graal é um texto sobre a própria criação poética. No caso, Tornaghi lembra que a literatura exige muitas leituras, variando o nível de profundidade. É claro que há textos de compreensão mais imediata e outros que requerem leituras mais cuidadosas e em momentos diferentes. Aliás, reparemos que, quando relemos um poema, anos depois do primeiro contato, normalmente percebemos algo novo, afinal também já não somos os mesmos leitores. A plurissignificação a que se refere o poeta na primeira estrofe é uma das definições do poético, pois há quem estabeleça a seguinte relação: quanto mais significativo o texto, mais poético.
Na prática sabemos que há poemas pouco conotativos ou mesmo denotativos, segundo as diferentes intenções dos autores. Mas não é destes poemas que Graal trata. Para Tornaghi a literatura não se basta com o dizer objetivo, com a superfície das palavras e só se realiza, à medida que produz significações múltiplas. Neste ponto, poderíamos nos lembrar da teoria simbolista do final do século XIX e que se caracteriza por uma visão antecipadora das vanguardas do início do século passado. Ou seja, a carga simbólica do poema deve conter sugestões inesgotáveis.
Dizer o indizível era o desejo daqueles simbolistas, mas cremos que não só deles. Em épocas diversas, os poetas buscam com o cifrar das palavras decifrar sentidos que eles mesmos desconhecem. Não escrevem para dizer alguma coisa, escrevem para que alguma coisa seja dita.
Feliz o poeta que consegue fazer o poema que pulse e que instigue a leitura redobrada do receptor, assim como redobrados são os sentidos dos versos em teias e redes.


Marcus Vinicius Quiroga

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