segunda-feira, 25 de maio de 2009



DA PALAVRA II


Não quero ser poeta
da palavra arcaica
do sentido obscuro
Nem da fórmula clichê
do entendimento rápido

Não quero ser poeta
-fermento das massas–
no vocábulo vulgo
de idéias soladas
Nem também da minoria
que diz entender tudo
sem entender nada

Quero ser poeta
qual bruxa ou fada
-mágica-
no intuitivo discurso
da palavra calada

Elisa Flores

O SENTIDO OBSCURO

Cabral costumava dizer que não gostava de certos poetas, porque, quando os lia, entendia os textos imediatamente. logo É claro que era uma “boutade”, uma frase de espírito, mas não deixava de ser um modo sutil (ou não) de fazer critica a um certo tipo de poesia, em que a transparência é total ou quase.
Sim, já houve períodos em que se valorizavam poetas herméticos como Gôngora, que deu origem ao adjetivo gongórico como sinônimo de texto difícil, intrincado. Coincidência ou não, Cabral tinha uma quedinha confessa pelo autor espanhol.
No século XX, em todas as artes, houve uma valorização em alguns momentos da não decodificação da obra, digamos assim. Quanto mais fechada, mais apreciada por certa parte da crítica. E, se olharmos bem, isto ocorreu talvez mais no cinema, na pintura ou no teatro do que na poesia. Diria, de forma inversa, que a poesia muito óbvia, muito compreensível foi desqualificada pela crítica uniersitáira, por exemplo.
Aqui cabe pensar o velho binômio transparência x opacidade. Se transparente, o texto será mais facilmente entendido pelo leitor, portanto será lido e, quem sabe, admirado. Já o texto que exige atenção, releitura ou maior nível de instrução não será popular.
De um modo geral, os textos fracos não oferecem dificuldade de leitura, mas isto não quer dizer que um texto simples não possa ser de qualidade. Por outro lado, um poema excessivamente hermético também não é garantia de boa poesia.
Ou seja, a poesia lida sempre com as duas categorias (opacidade e transparência), sem apresentar uma definição de grau de literariedade com base apenas nestes conceitos opostos.
Se lembrarmo-nos da teoria da comunicação, diríamos que uma mensagem totalmente transparente é redundante e provavelmente não teria valor artístico; já a mensagem inteiramente opaca não seria compreendida. Murilo Mendes e Manoel de Barros são poetas distintos: este é lido por um público mais vasto, incluindo os não leitores normais de poesia, já aquele requer um leitor mais paciente, dado a releituras, e que goste do desafio da linguagem densamente conotativa.

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