segunda-feira, 22 de junho de 2009

LEIA O NOVO NÚMERO DA REVISTA DA UNIÃO BRASILEIRA DOS ESCRITORES

EDITADA POR EDIR MEIRELLES





A LÍNGUA É O EXÍLIO

Mais de 80% das publicações das grandes editoras são de escritores estrangeiros e menos de 1% é de poesia. Não é à toa (ainda que lamentavelmente) que os suplementos literários dedicam, por sua vez, a maioria das páginas (uns 85%) aos autores de fora. Ou seja: edita-se, divulga-se, critica-se e distribui-se pouco o livro de escritor brasileiro. Depois, é claro, diz-se que o autor nacional dá prejuízo, justificando, assim, a quantidade de best sellers despejada cérebro adentro, goela abaixo. De best seller e de block buster faz-se a cultura colonizada do país.
Crescemos ouvindo música em inglês o tempo todo nas rádios, a despeito da reconhecida qualidade da música popular do país. Crescemos lendo legendas nas sessões de cinemas e desprezando o cinema nacional por razões técnicas. E, se no teatro ainda ouvimos português, trata-se na maior parte também de peças estrangeiras obviamente traduzidas. Afinal, o que é bom para os Estados Unidos e para a Europa é bom para o Brasil.
Apesar de sermos a quinta língua mais falado no mundo, com aproximadamente 280 milhões de usuários, estamos isolados na América espanhola e com pequena receptividade nos demais continentes. Isto é: o escritor brasileiro sabe que escreve só para o brasileiro, e sabe também que, somados os analfabetos, os semi-alfabetizados e os analfabetos funcionais, temos 70% da população. Logo, ele escreve para um público que representa, na prática, menos de 30% dos leitores possíveis.
Falar aqui na livre concorrência de mercado entre o livro brasileiro e o livro estrangeiro que nos chega com fama de grande vendagem é o mesmo que recontar a fábula do lobo e da ovelha. E, na sua versão atual, todos sabemos que o autor nacional não é o lobo.
Já que não exportamos literatura, precisamos do mercado interno. E este só irá crescer, quando crescer significativamente o número de cidadãos educados, e não o número simplesmente estatístico de cidadãos alfabetizados. Sem investimentos efetivos na Educação, a Literatura, bem como as demais artes, não se autossustenta e boa parte das edições é paga pelos autores ou pelo dinheiro público. A médio e longo prazos, mais valem boas escolas públicas e boas bibliotecas por todo o país do que patrocínios governamentais para as atividades artísticas.
Curiosamente somos um país que edita bastante, mas com tiragens reduzidas, o que encarece o preço final do livro, tornando-o artigo de luxo no cardápio da família brasileira média . Assim como temos uma absurda concentração de renda e de terra nas mãos de pouquíssimos, temos uma concentração de livros nas mãos também de muito poucos.
Só que neste caso os mais ricos não são necessariamente os que leem mais. Ao contrário, até associamos a leitura e a prática de atividades intelectuais à falta de dinheiro, criando uma imagem negativa do livro. Na nossa sociedade, salvo exceção, o professor, o intelectual, o escritor ou o artista de um modo geral, que são também o consumidor em potencial dos livros, não têm dinheiro. O país de dimensões continentais (como é lugar-comum dizer) torna-se, portanto, uma pequena ilha de análise, reflexão e crítica no oceano do pensamento standard e da cultura fast food.
A língua, poeta, não é a nossa pátria, mas o nosso exílio.

Marcus Vinicius Quiroga


Nenhum comentário:

Postar um comentário