quarta-feira, 7 de outubro de 2009

QUEM TEM MEDO DA LINGUAGEM?





Depois da rigidez das estéticas dos anos 60, gerações seguintes afrouxaram o cuidado com a linguagem, mais interessadas em dizer algo do que em “como” dizê-lo. Em nome de um espontaneísmo do primeiro momento modernista, escreveram-se muitos textos descartáveis e de duvidosa literariedade. O fato é que os poetas cujos livros tiveram (ou mantiveram) o reconhecimento crítico nos últimos trinta anos são justamente aqueles que não se deixaram levar por modismos ou valores literários de pequenos grupos, forjando uma obra individual e independente.
No final do século, vimos com prazer o crescimento das leituras poéticas e o aumento de edições de livros. Ouvidos e olhos, portanto, têm-se dedicado aos versos de inúmeros poetas que representam a voz contemporânea da poesia carioca. Parece-nos, todavia, que ainda nos esquecemos, muitas vezes, da lição mallarmaica de que a poesia é feita com palavras e, consequentemente, a questão estética fica relegada a um segundo (ou sabemos lá qual ) plano.
A questão da linguagem não é privilégio de um estilo ou de uma época. Antes faz (ou deveria fazer) parte de todo projeto literário dos escritores, já que a palavra é sua matéria-prima. Está evidente em João Cabral, Haroldo de Campos, Ivan Junqueira, Antonio Carlos Secchin, Salgado Maranhão, Reynaldo Valinho ou Geraldinho Carneiro, só para citarmos bons autores e com produção bem distinta. Logo o cuidado com a linguagem não é suficiente para marcar as diferenças estéticas. Talvez o seja para diferençar o literário do para-literário.
Com surpresa e felicidade, nós todos temos entrado em contato com um número alto de poetas novos, mas nos indagamos sobre quantos, de fato, mostram que estão reescrevendo os textos e que têm na palavra (o material de seu ofício, insistimos) um objeto obrigatório. Por favor, não confundirem cuidar da palavra com fazer textos metalinguísticos.
Um poema , mesmo isoladamente, representa uma intenção estética, não a simples manifestação de um estado anímico, uma confissão sentimental ou uma observação subjetiva do cotidiano. A poesia, como já disse André Gide sobre a literatura em geral, não se faz com bons sentimentos; fazem-se, talvez, com bons sentimentos, as missivas amorosas. Mas o escritor tem que saber o que está fazendo, posto que a “poesia” não é fruto do acaso ou de uma predisposição eventual. Poesia que não se sabe poesia merece outra denominação. Daí a pergunta inicial esperar pela resposta dos poetas. Afinal, quem tem medo da linguagem?

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