quinta-feira, 8 de outubro de 2009

POESIA E EMPATIA


A aceitação de um texto literário se dá, entre outras razões, pela identificação do leitor com a obra. O autor é, neste caso, um porta-voz das aspirações, sentimentos e experiências que fazem parte de um repertório coletivo. Independente de méritos literários, gostamos do texto que parece ter sido feito sob medida para nós, um espelho em que nos vemos com certa precisão e no qual encontramos nossos desejos e sentimentos e questões.
Na prosa, esta identificação é mais fácil de ocorrer: o enredo se confunde com a nossa vida e o personagem se parece conosco ou com o que gostaríamos de ter sido. Esta é normalmente uma das causas pelas quais relemos inúmeras vezes determinado romance. Na ficção nós nos realizamos.
Já na poesia, a empatia com o texto trata de sensações e não exatamente de papéis, episódios, histórias. Estamos diante de um eu-lírico, não de um personagem. E, mesmo quando o poema é mais narrativo, a identificação de qualquer modo exige uma coincidência de sensações, uma proximidade de intenções, uma semelhança de visão do mundo. Muitas vezes a identificação é inexplicável, como a que existe com a música, isto é, somos atraídos pela musicalidade ou pelas imagens dos versos, sem outras motivações racionais.
Mas é bom ter sempre atenção e perceber o que nos aproxima de um poema. Suponhamos que seja uma razão ideológica: gostamos do texto porque ele defende ideias políticas parecidas com as nossas ou apreciamos os versos finais e somos arrebatados porque o poeta menciona Deus e somos religiosos. Talvez alguém com formação política diferente ou um ateu não veja no poema tantas qualidades quanto as que vimos. Será que neste caso, por exemplo, não deixamos os critérios estéticos de lado, e agimos segundo a nossa ideologia, sem nos darmos conta?

Um comentário:

  1. Bela análise, meu querido amigo. Eu, por exemplo, sempre coloco minhas posturas, religiosas ou políticas ous entimentais, nos poemas. Seria um risco? (risos) Mas, concordo inteiramente com sua análise. Existe mesmo essa identificação/espelho. Um abraço e o BLog está com debates/ textos maravilhosos.

    Marcelo Mourão

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