Poemas de Leminski
Livro: LA VIE EN CLOSE
editora brasiliense
vídeo postado em:
http://papopoetico.blogspot.com/
PROFISSÃO DE FEBRE
quando chove,
eu chovo,
faz sol,
eu faço,
de noite,
anoiteço,
tem deus,
eu rezo,
não tem,
esqueço,
chove de novo,
de novo, chovo,
assobio no vento,
daqui me vejo,
lá vou eu,
gesto no movimento
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RUMO AO SUMO
Disfarça, tem gente olhando.
Uns, olham pro alto,
cometas, luas, galáxias.
Outros, olham de banda,
lunetas, luares, sintaxes.
De frente ou de lado,
sempre tem gente olhando,
olhando ou sendo olhado.
Outros olham para baixo,
procurando algum vestígio
do tempo que a gente acha,
em busca do espaço perdido.
Raros olham para dentro,
já que dentro não tem nada.
Apenas um peso imenso,
a alma, esse conto de fada
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tudo é vago e muito vário
meu destino não tem siso
o que eu quero não tem preço
ter um preço é necessário,
e nada disso é preciso
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LÁPIDE 1
epitáfio para o corpo
Aqui jaz um grande poeta.
Nada deixou escrito.
Este silêncio, acredito,
são suas obras completas.
LÁPIDE 2
epitáfio para a alma
aqui jaz um grande artista
mestre em desastres
viver
com a intensidade da arte
ERRA UMA VEZ
nunca cometo o mesmo erro
duas vezes
já cometo duas três
quatro cinco seis
até esse erro aprender
que só o erro tem vez
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você está tão longe
que às vezes penso
que nem existo
nem fale em amor
que amor é isto
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IN HONORE ORDINIS SANCTI BENEDICTI
à ordem de são bento
a ordem que sabe
que o fogo é lento
e está aqui fora
a ordem que vai dentro
a ordem sabe
que tudo é santo
a hora a cor a água
o canto o incenso o silêncio
e no interior do mais pequeno
abre-se profundo
a flor do espaço mais imenso
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OUVERTURE LA VIE EN CLOSE
em latim
“porta” se diz “janua”
e “janela” se diz “fenestra”
a palavra “fenestra”
não veio para o português
mas veio o diminutivo de “janua”
“januela”, “portinha”,
que deu nossa “janela”
“fenestra” veio
mas não comoesse ponto da casa
que olha o mundo lá fora,
de “fenestra” veio “fresta”,
o que é coisa bem diversa
já em inglês
“janela” se diz “window”
porque por ela entra
o vento (“wind”) frio do norte
a menos que a fechemos
como quem abre
o grande dicionário etimológico
dos espaços interiores
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um bom poema
leva anos
cinco jogando bola,
mais cinco estudando sânscrito,
seis carregando pedra,
nove namorando a vizinha,
sete levando porrada,
quatro andando sozinho,
três mudando de cidade,
dez trocando de assunto,
uma eternidade, eu e você,
caminhando junto
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Paulo Leminski
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