terça-feira, 22 de setembro de 2009

O LIVRO DE JOSÉ HENRIQUE CALAZANS

DESAFINANDO O CORO DOS CONTENTES



Quem vai ler essa merda? é o primeiro livro de José Henrique Calazans, que, apesar de jovem, já tem sido bastante premiado em concursos, como este da revista Day by night, responsável pela edição de seu livro. Fazemos questão de salientar a sua juventude para que o leitor possa dimensionar o talento presente em seus poemas de agora, com a certeza de que este é só o início de uma obra com inegáveis méritos literários.
Como ocorre com outros livros de estreia, este nos oferece uma variedade de formas e opções estéticas. Temos à disposição poemas com versos livres até metrificados com rigor; tanto haicais quanto poemas mais discursivos; de sonetos bem estruturados a poemas visuais; de trova a poema concreto...
Quanto à temática, sua diversidade abarca os motivos amorosos, a denúncia social, a reflexão existencial, o comentário do cotidiano e a crítica política. O lirismo, por exemplo, se dialoga com a tradição em Todas as faces do céu, em Desejos ou em Luzeiros; une oswaldianamente amor e humor no surpreendente A uma boneca inflável, como nos mostram os versos “Desejo com ardor seu beijo plástico/ em nossas noites de paixão idílica”, ou em Triângulo* amoroso, com o uso lúdico de símbolos matemáticos.
O humor, aliás, é uma das marcas de sua poética e se explicita nas sátiras sociais (Condomínio de deus) e políticas (Receita para pizzas). Acreditamos, pela leitura deste pequeno volume, que esta será uma das vertentes literárias que o poeta escolherá, pois são patentes o seu olhar crítico e suas observações mordazes sobre a sociedade e a política do país.
Se por um lado, a irreverência, da qual o título é um evidente exemplo, emerge de seus versos; por outro, o tom sério também aparece em poemas como Plantação, de excelente fatura, graças ao desdobramento metafórico que opera: homem, terra, morte, adubo, semente, homem; ou em O disfarce, que chega a lembrar Augusto dos Anjos na seguinte imagem: “Quando nascemos, nossa morte a parca fia/ e o lindo berço com a cova se entrelaça”.
Ainda temos a união da irreverência e da seriedade na paródia Poema de sete dribles, homenagem a Mané Garrincha, personagem tragicômico, que, com seus dribles e seu estilo à Carlitos, tanto comoveu os espectadores, fundindo humor e dor como todo bom clown.
A questão poética, tão em moda desde o Modernismo, também não escapa ao autor, que dela trata pelos menos em quatro poemas – O poeta ébrio, Visionários e Pérolas e Meu verso -, nos quais a poesia aparece dionisicamente como embriaguez e alucinação, mas, sobretudo, como algo capaz de realizar metamorfoses como a de transformar porcos em pássaros-poetas. E em Meu verso, temos se não ainda a arte poética do autor, ao menos a síntese atual de seus textos, que se diversificam em versos elegíacos, eróticos, melancólicos, humorísticos, críticos e denunciadores.
Sua linguagem lírica e violenta; sua visão atenta do mundo; sua insatisfação com os males e as injustiças da sociedade, e sua dicção satírica nos dão convicção de que sua voz não “cairá no esquecimento” e que alcançará seu propósito de desafinar o coro dos contentes, seja este um coro literário ou não.
Lembrando aqui o uso da palavra merda feito internacionalmente pelos atores de teatro, antes do início dos espetáculos, peço licença ao autor para inverter a pergunta-título e dizer “Quem vai deixar de ler essa merda?”



Marcus Vinicius Quiroga

Um comentário:

  1. Um jovem e excelente escritor, que escreve sobre diversos temas com os vigor e primor
    necessários a qualquer poeta militante,
    carregando junto aos companheiros do POLEM
    a bandeira da Poesia!
    Eu o recomendo!

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