Poemas de Antonio Carlos Secchin
ditos por Eduardo Tornaghi em:
http://papopoetico.blogspot.com/
“NÃO, NÃO ERA AINDA A ERA DA PASSAGEM”
Não, não era ainda a era da passagem
do nada ao nada, e do nada ao seu restante.
Viver era tanger o instante, era linguagem
de se inventar o visível, e era bastante.
Falar é tatear o nome do que se afasta.
Além da terra, há só o sonho de perdê-la.
Além do céu, o mesmo céu, que se alastra
num arquipélago de escuro e de estrela
“A CASA NÃO SE ACABA…”
A casa não se acaba na soleira,
nem na laje, onde pássaros se escondem
A casa só se acaba quando morrem
os sonhos inquilinos de um homem.
Caminha no meu corpo abstrata e viva,
vibrando na lembrança como imagem
de tudo que não vai morrer, embora
as maçãs apodreçam na paisagem.
Sob o ríspido sol do meio-dia,
me desmorono diante dela, e tonto
bato à porta de ser ontem alegria.
O silêncio transborda pelo forro.
E eu já nem sei o que fazer de tanto
passado vindo em busca de socorro
COLÓQUIO
Em certo lugar do país
se reúne a Academia do Poeta Infeliz.
Severos juízes da lira alheia,
sabem falar vazio de boca cheia.
Este não vale. A obra não fica.
Faz soneto, e metrifica.
e esse aqui, o que pretende?
Faz poesia, e o leitor entende!
Aquele jamais atingirá o paraíso.
Seu verso contém a blasfêmia e o riso.
Mais de três linhas é grave heresia,
pois há de ser breve a tal poesia.
E o poema, casto e complexo,
não deve exibir cenas de nexo.
Em coro a turma toda rosna
contra a mistura de poesia e prosa.
Cachaça e chalaça, onde se viu?
poesia é matéria de fino esmeril.
Poesia é coisa pura.
com prosa ela emperra e não dura.
É como pimenta em doce de castanha.
Agride a vista e queima a entranha.
E em meio a gritos de gênio e de bis
cai no sono e do trono o Poeta Infeliz.
LINGUAGENS
Percebi que o vôo negro dessa hipálage
beijava o mel dos lábios da metáfora,
e mais beijara, se não fosse a enálage,
e mais revoara, se não fosse a anáfora.
Chorei mil mares profundos de hipérbole,
duas velas cortaram a metonímia,
enquanto o pé da catacrese andava
no compasso bem toante dessa rima.
Verteu prantos a anímica floresta,
mas nós entramos dentro do pleonasmo,
‘stamos em pleno oceano de uma aférese…
Vai-se o expletivo, mais um e outro mais…
Os poetas, nós somos muito silépticos;
mas os poemas, elípticos demais.
Poemas de Manuel Bandeira
2˚ vídeo da antologia
-em “A cinza das horas”
RENÚNCIA
Chora de manso e no íntimo… Procura
Curtir sem queixa o mal que te crucia:
O mundo é sem piedade e até riria
Da tua inconsolável amargura.
Só a dor enobrece e é grande e é pura.
Aprende a amá-la que a amarás um dia.
Então ela será tua alegria,
E será, ela só, tua ventura…
A vida é vã como a sombra que passa…
Sofre sereno e de alma sobranceira,
Sem um grito sequer, tua desgraça.
Encerra em ti tua tristeza inteira.
E pede humildemente a Deus que a faça
Tua doce e constante companheira…
-em “Carnaval”
BACANAL
Quero beber! cantar asneiras
No estro brutal das bebedeiras
Que tudo emborca e faz em caco…
Evoé Baco!
Lá se me parte a alma levada
No torvelim da mascarada,
A gargalhar em doudo assomo…
Evoé Momo!
Lacem-na toda, multicores,
As serpentinas dos amores,
Cobras de lívidos venenos…
Evoé Venus!
Se perguntarem: Que mais queres,
Além de versos e mulheres?…
– Vinhos!… o vinho que é o meu fraco!…
Evoé Baco!
O alfange rútilo da lua,
Por degolar a nuca nua
Que me alucina e que eu não domo!…
Evoé Momo!
A lira etérea, a grande lira!…
Por que eu extático desfira
em seu louvor versos obscenos,
Evoé Vênus!
Os Sapos
Enfunando os papos,
saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.
Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
–”Meu pai foi à guerra!”
–”Não foi!” –”Foi!” –”Não foi!”.
O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: – “Meu cancioneiro
É bem martelado.
Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.
O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com
Consoantes de apoio.
Vai por cinquenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A forma a forma.
Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas…”
Urra o sapo-boi:
– “Meu pai foi rei” – “Foi!”
– “Não foi!” –”Foi!” –”Não foi!”.
Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
– “A grande arte é como
Lavor de joalheiro.
Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo.”
Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas:
–”Sei!” –”Não sabe!” – “Sabe!”.
Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Verte a sombra imensa;
Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é
Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio…
1918
Passando p retribuir a visita e p agradecer o convite, Eduardo.
ResponderExcluirOlharei agora o blog da poesia pelada na praia. rsrs. Adorei a iniciativa. Não conheço o Rio, mas indo por aí, apareço sim.
Vou adicionar como seguidora p me manter informada do trabalho de vocês.
Abraços poéticos!